Ontem à noite Globonews (“Jornal das Dez”) chateadinha com as palavras duras usadas na imprensa internacional sobre a tragédia no Rio.
Aqui, no texto de O Globo, um resumo dos vários jornais internacionais sentando a lenha na vecchiaia e na falta de manutenção das edificações do Rio.
Antes, uma reportagem sobre as maravilhas do recém-implantado Centro de Operações (apesar de os bombeiros terem chegado 15 minutos depois). E depois, pra compensar, uma estocadinha nos defeitos no controle urbanístico em Nova York.
Então, é algo assim: vejam como estamos nos esforçando, e vocês vendo tudo de fora, nos julgando cruelmente.
Acepipes para o Rio sentir na pele o que é se dispor a trabalhar por uma cidade melhor e ninguém reconhecer.
Imagine agora se o problema da imagem do Rio não fosse a Olimpíada ou a Copa: fosse apenas uma questão política, uma sanha furreca do partido do governo federal em arrombar na marra a cidade e o estado: eis aí a jaca em São Paulo. Tendeu?
Vamos combinar uma coisinha: Rio de Janeiro é uma cidade linda e cosmopolita; e São Paulo, também linda e cosmopolita, tem serviços públicos e particulares muito avançados em relação ao resto do país (inclusive diante do Rio).
No entanto, as duas únicas metrópoles – na acepção ampla da palavra – do Brasil estão no Brasil, ou seja, pertencem a um país ATRASADO, feito de pessoas atrasadas e ignorantes. Não é culpar A, B ou C. É um conjunto da obra malfeita, que atinge desde o desabrigado da chuva até o empreendedor inescrupuloso.
Prédios fortes, prédios mais ou menos (estruturas que vão rareando à medida que os andares se tornam mais altos – isso existe!), até os molambos sem fundação e os gloriosos prédios de areia da praia do Sérgio Naia, eis aí o resumo de nossa habitação.
Essas grandes reformas urbanas, os avanços que tentamos fazer aqui, abertura de grandes avenidas, retrofit, reformas educacionais, uso de sacolas compostáveis, revitalização de áreas centrais, pensar e executar o urbano e o social, e tal, isso a Europa já fazia nos séculos XVII e XVIII, seguida com discreto atraso pelos EUA.
Enquanto São Paulo, no século XIX, ainda se via às voltas com tropeiros e poeira, Paris e Londres, por exemplo, dedicavam os miolos a superar em luxo e beleza suas arcadas (centros de compras envidraçados, os avós dos shopping centers).
E imagina quantas vezes as cidades europeias pensaram e agiram em relação a suas condições de esgoto, limpeza de rios, fiação, edificações?
Sentiu o drama? A gente está sempre atrasado.
Com a agravante de que ninguém no Brasil precisou inventar a roda. Sempre tivemos à mão os exemplos bem-sucedidos de soluções em países mais desenvolvidos/antigos. Não temos nem o trabalho de pensar a partir do nada.
Os problemas são os mesmos onde há grandes aglomerações não cuidadas. Isso não é vergonha, acontece com todo mundo. Para consertar, é só adaptar para a realidade brasileira o que deu certo.
Lembram do Joelma e do Andraus? Pois é, a gente é movido a cadáveres. Foi a partir dessas duas tragédias que implantamos, não só em São Paulo mas no Brasil todo, normas bem boinhas de segurança contra incêndios.
Tomara Deus que o Edifício Liberdade vire uma legenda e igualmente alavanque um movimento: que cada prefeitura e que cada proprietário/inquilino tome a peito e para si a tarefa de fiscalizar/zelar não só pelo seu espaço particular, mas pelo entorno, pelo comum, pelo coletivo.
Com Copa ou sem Copa, com Olimpíada ou não, com eleição ou não: pela gente mesmo.