Ainda a saúde: constatações

Eu com a boca aberta, só na base do ahã-ahã, e minha dentista: “Você viu o caso do noivo que morreu?

Àquela altura havia me convencido de que o caso tinha sido um fatalismo mesmo.  Você lê desgraças no jornal, e tal, e fica à procura de falhas no roteiro. Todos nós fazemos isso, mas aquilo me convenceu da obra do destino – muito embora meu pai tenha elaborado bastante sobre a idiotice de alguém enfiar uma flute no bolso.

Depois – e as primeiras notícias não tinham entrado nos detalhes – é que ficamos sabendo que os parentes o enfiaram num carro e o levaram para uma UPA 24 horas em Cocotá, na Ilha do Governador, e que lá – uma madrugada de domingo – só havia uma enfermeira, incapaz de prestar um primeiro atendimento, por mais inicial que fosse. O rapaz chegou morto ao hospital municipal Paulino Werneck, também na Ilha do Governador.

Bem, só estando lá pra saber, mas o fato é que cidadãos brasileiros – ao contrário dos americanos, p. ex. – não têm cultura de primeiros socorros. Se você achar de ter um treco ou sofrer um acidente entre humanos comuns, pode ter certeza que levará seu intento até o fim, porque a gente gosta mesmo é de cercar a vítima aos berros e improvisar um travesseirinho, e só.

Fico pensando se no Rio não tem serviço de Resgate ou de Samu, que certamente chegaria rápido e “estabilizaria” a vítima até a remoção. Fico pensando também sobre a salada geral, porque os fogos de artifício do governo federal jurava que as UPAs também teriam atendimento de pronto-socorro, então é uma piada de mau gosto precisar de atendimento de urgência no meio da noite e topar com apenas uma enfermeira lixando as unhas.

O rapaz morreu por falta de atendimento, e ponto.

Então é isso: se casar, faça-o em SP. Se acontecer alguma fatalidade como essa, pelo menos a imprensa ficará na litotripsia até o secretário de saúde cair.

Saúde sem intermediários

O que temos falado, e só se pode chegar à conclusão de que o sistema particular de atendimento e os pacientes fariam muito melhor se mandassem os planos de saúde para o espaço sideral. Na Folha:

Atendimento “express”, como no SUS

O crescimento da economia do país, nos últimos anos, sem dúvida melhorou a vida de muitos brasileiros, que passaram a consumir mais e ter acesso a serviços antes inatingíveis.

Entre as conquistas de milhões de pessoas está o tão sonhado plano de saúde, na tentativa de fugir de hospitais públicos lotados, com macas nos corredores, falta de médicos e outros funcionários e de atenção adequada ao ser humano.

Esses usuários, porém, só trocaram de drama. Os planos de saúde são gigantes que, entre uma fusão e outra, lucram sem parar, mas oferecem bem pouco a quem paga muito caro pelo serviço.

Tendências/Debates Eventuais insuficiências são localizadas

No momento da venda, os planos de saúde prometem renomados hospitais, exames sofisticados e uma considerável carteira de médicos. Mas a realidade é bem diferente. Os médicos sofrem com a baixa remuneração e acabam optando pelo atendimento, digamos, “express”.

Para se ter uma ideia, a maioria das consultas médicas é remunerada pelos planos com valores entre R$ 18 e R$ 50. Em casos extremamente raros, especialistas renomados recebem até R$ 200 somente de planos considerados top de linha pelo mercado. A situação piora, em se tratando de atendimento multidisciplinar. Paga-se de R$ 4 a R$ 7 pela sessão de fisioterapia, por exemplo.

Pressionados pela baixa remuneração, os médicos realizam de quatro a cinco consultas por hora.

São, em média, nem 10 minutos com o paciente. Esse tempo é obviamente insuficiente para a mínima investigação dos sintomas apresentados, podendo causar diagnósticos imprecisos. O bom exercício da medicina exige exame físico minucioso, atenção à história da doença, à descrição dos sintomas e uma análise, ainda que sumária, das condições de vida e da personalidade da pessoa a sua frente.

A fundamental relação entre médico e paciente simplesmente desaparece nos atendimentos remunerados pelos planos de saúde. São praticamente desconhecidos que entram e saem dos consultórios, sempre com guias de exames na mão e nenhuma certeza do mal que os aflige.

Em meio à falta de consenso entre operadoras e médicos, a população brasileira pena com problemas básicos de rotina como demora na marcação de consultas, na liberação de exames e até com o absurdo da negativa para realização de cirurgias.

As consultas se transformaram em verdadeiras linhas de produção, algo capaz de dar inveja à indústria automobilística. Já virou rotina clientes recorrerem à Justiça para conseguir ter acesso a procedimentos essenciais aos tratamentos.

O que os empresários parecem não enxergar é que, embora consigam mão de obra barata graças à proliferação de faculdades de medicina de baixíssima qualidade, acabam perdendo dinheiro ao pagar honorários irrisórios aos seus profissionais credenciados.

Isso porque, sem o exame físico adequado, os médicos solicitam procedimentos muitas vezes desnecessários, pagos pelos “empresários da saúde”. Dor de estômago? Endoscopia. Tosse? Raio-x do tórax. Os resultados estão normais? Então é hora de exames mais complexos… E é assim que funciona a relação entre médico e paciente nos dias de hoje.

A economia no preço das consultas resulta em contas elevadíssimas pagas aos hospitais, porque lá chegam os pacientes que não tiveram o diagnóstico precoce. Ao que me parece, os lucros dos planos de saúde são tão elevados que até estas perdas com pacientes que acabam nos centros cirúrgicos são consideradas parte do jogo.

Sinceramente, me incomoda a má formação e a desqualificação dos meus colegas de profissão. No entanto, me preocupo muito mais com os pacientes atendidos por médicos que recebem menos por consulta do que os guardadores de carro da cidade de São Paulo.

ALFREDO SALIM HELITO, 54, é médico de família, clínico-geral do Hospital Sírio-Libanês e coautor de “Análise Crítica da Prática Médica” (Campus)

Batatíssima!

Faço “questã” de reproduzir na íntegra artigo de Reinaldo Azevedo publicado na Veja no meio da manhã sobre o que estamos falando: de números, e não de pitacos:

Dados mostram que SP oferece menos risco do que o país

A política de segurança pública de São Paulo está sendo fuzilada sem chance de defesa, com requintes de covardia técnica, intelectual e política. Houve, sim, um recrudescimento da criminalidade no estado, o que requer uma intervenção especial do poder público. Mas daí a caracterizar a situação como perda do controle vai a diferença que distingue a verdade da mentira. O alarde não busca corrigir erros e vícios. Ao contrário. Ele ignora e esmaga as virtudes de uma gestão que, nos últimos dez anos, merece mais elogios do que críticas, conforme mostra a edição de VEJA desta semana.

Não me ocupo de impressões, mas de dados; não me posiciono sobre utopias redentoras, mas sobre fatos. E é fato que o estado de São Paulo, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (leia o documento na íntegra clicando no link abaixo), apresentou uma das mais baixas taxas de crimes violentos letais intencionais (CVLI) do país em 2011 – 10,8 por 100 000 habitantes, atrás apenas do Amapá, com 0,9 por 100.000 habitantes. O CVLI leva em conta homicídios dolosos, latrocínios e crimes de lesão corporal que resultem em morte. Comparar é fazer justiça. O índice do Brasil como um todo é de 23,6 por 100 000. Em Alagoas, esse indicador alcança 76,3. No Espírito Santo, vai a 45,6. Em Pernambuco, chega a 38,1. Sergipe tem 33,9. Na Bahia, o índice alcança 33,2 e no Rio de Janeiro, 25,8. Sei que a informação parece desafiar o noticiário televisivo – e desafia mesmo. O fato é que a probabilidade de um fluminense ter sido vítima fatal de algum dos crimes medidos pelo CVLI no ano passado foi 138% maior do que a de um paulista. Existe alguma contestação razoável a essas estatísticas? Não.

Leia também: As percepções e a realidade sobre as mortes em São Paulo

Poderia eu ser acusado de estar usando números do ano passado para esconder que, neste ano, São Paulo superou a média brasileira e também a do Rio em crimes de morte? Não. No pior dia da atual onda de violência, houve 22 assassinatos em São Paulo. Um absurdo, sim, para o estado, mas não para o Brasil. Só para pensar, anualizo esse número, multiplicando-o por 365 (o que é um exercício de reductio ad absurdum, pois é impossível que qualquer cidade do mundo, muito menos São Paulo, possa ter todos os dias do ano iguais ao seu pior dia). Mas vamos seguir adiante. Por esse cálculo, seriam, então, no fim do ano, computados 8 030 crimes de morte. Considerando a mesma população levada em conta pelo Anuário, São Paulo atingiria a assustadora taxa de 19,2 mortos por 100.000 habitantes. Repito, se São Paulo atingisse todos os dias do ano a sua pior marca diária, a sua taxa de homicídios ainda seria cerca de 26% menor do que as efetivamente atingidas pelo Rio de Janeiro ou 42% menor do que as taxas da Bahia, por exemplo. Ao fim deste texto, há os respectivos endereços eletrônicos do Anuário e do Mapa da Violência. Eu os convido a consultá-los.

O Brasil é um país perigoso. Foram assassinadas, em 2011, perto de 50.000 pessoas – não há o número exato porque há estados que omitem dados. São Paulo oferece menos risco do que o Brasil. Se a taxa nacional fosse igual à do estado, cerca de 30 000 pessoas mortas de forma violenta estariam vivas hoje. Número é argumento. O estado de São Paulo tende a fechar o ano com 10,77 mortos por 100.000 habitantes. Na cidade de São Paulo, o índice deve chegar a 11,3 por 100.000. Isso significa que, no ano em que São Paulo foi mostrado na televisão como um teatro de guerra urbana, o estado ainda figurará nas estatísticas confiáveis como o mais seguro do Brasil.

É preciso olhar também a história. Segundo o Mapa da Violência (leia o documento na íntegra clicando no link abaixo), houve 42,2 mortos por 100.000 habitantes no estado em 2000. Em 2010, 13,9 – menos 67%. Foi a maior queda de criminalidade registrada no Brasil. A taxa recuou em apenas sete unidades da federação. Subiu nas outras vinte. Muitas vezes brutalmente (303,2% na Bahia; 269,3% no Maranhão; 252,9% no Pará).

A vida humana é assunto sério e não pode ficar entregue a chicanas político-partidárias e ao terrorismo. Usar a criminalidade urbana como parte de um projeto político para tomar o Palácio de Inverno – no caso, o dos Bandeirantes – não é decente e merece o repúdio dos paulistas e de todos os brasileiros de bem.

Anuário Brasileiro de Segurança Pública: www.veja.com/seguranca

Mapa da Violência: www.veja.com/mapa

Então é isso: o pior de São Paulo ainda é muito melhor que boa parte do país. É uma realidade qual a qual se deve conviver, pelo menos até a próxima gestão – quem sabe ela não torna o estado mais “igualitário”, não é mesmo?

A verdade é a verdade, oras…

Josias de Souza andou criticando a fala do governador Alckmin sobre a percepção da imprensa a respeito da situação do estado no combate às ações da facção criminosa:

Para o governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) há um quê de exagero nas notícias sobre o surto de violência que o rodeia. Acha que é preciso levar em conta o tamanho do mapa. “Aqui é maior que a Argentina; é a terceira maior metrópole do mundo, com 22 milhões de pessoas”, disse, referindo-se à capital e região metropolitana.

A conta de 2012 ainda não foi fechada, mas já soma algo como 200 civis e mais de 90 policiais assassinados. Alckmin acha inadequado chamar o flagelo de ‘guerra’ da criminalidade contra a polícia. “É preciso dar o devido [critério]”, do contrário, “se cria uma situação muito injusta, quase que uma campanha contra São Paulo. E não é possível fazer isso e ainda criar uma situação de pânico na população.”

Alckmin não se deu conta, mas flerta com o inusitado. Governador de Estado que reclama do noticiário é como comandante de navio que se queixa da existência do mar.

Acho que quem não se dá conta é a imprensa mesma. Ou não se dá conta, ou finge não se dar. Que há campanha contra São Paulo, é inegável. Isso existe com política ou sem política, com bandidos ou sem, desde os tempos de Amador Bueno.

Em segundo lugar, São Paulo é maior que a Argentina, sim. É a terceira maior metrópole do mundo, sim, e, pior, a nossa “pobreza” – sim, vamos aliar criminalidade com pobreza – é rica, acentuando a tendência nacional de todo bandido ser motorizado e tecnologicamente aparelhado à larga. Em terceiro, mesmo com as mortes recentes, os índices de homicídios no estado continuam mais baixos do que no Rio de Janeiro, por exemplo, contando com o fato de que só últimamente o RJ teve uma queda acentuada de mortes per capita pelo simples (simples mesmo) expediente de conseguir, com a ajuda das parcas forças federais, avançar morro acima e acabar com os feudos dos traficantes, espalhando-os alegremente Brasil adentro.

Assim que começaram os recentes ataques a policiais em SP surgiram algumas opiniões precipitadas, incluindo a do especiaista Walter Maierovitch, de que o ideal seria chamar o Exército para “tomar” as áreas estratégicas do tráfico, como se aqui fosse RJ e como se SP fosse um último bunker de implicância e resistência à glória lulesca do Governo Federal. E mais, como se a polícia paulista tivesse institucionalizado as milícias e como se as ações desde 2006 não ivessem dado certo.  Ora, isso não faria sentido aqui, já que não há áreas onde a polícia não entra, assim como não faz em Santa Catarina, alvo mais recente desses ataques e que também acaba de recusar tal hipótese.

Ora, não há prova maior da eficiência da polícia paulista do que o próprio fato de a facção criminosa ter decidido das cabo da vida de seus integrantes. A polícia paulista incomoda os bandidos, coisa que não ocorre nos demais estados da Federação, onde, parece, todos convivem na mais santa harmonia. Talvez seja esse o estado de coisas ideal para algumas opiniões, mas aqui não é (somos estranhos mesmo).

Diante das bravatas do Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo de que “o governo federal não era Casa da Moeda” pra ficar mandando dinheiro para São Paulo (como se isso não fosse obrigação), a presidente Dilma deu-lhe uma enquadrada e resolveu sentar-se com o governador para ver o que era possível fazer no estado e, parece, as demandas daqui venceram. Não queremos ações espetaculares e, sim, que o governo federal cumpra com suas obrigações.

Note que todas as “ofertas” conseguidas por Alckmin do Governo Federal não passam de compromissos que Dilma e seus ministros deveriam exercer normalmente, mas que não são cumpridas por desleixo, incompetência geral e incompetência específica do governo petista: atuação na fiscalização de estradas – “autorização” da PM paulista para atuar nas estradas federais do estado -, transferência de presos, atuação em portos e aeroportos, agilização da burocracia diária na Justiça e estreitamento da atuaçao conjunta com a Polícia Federal.

Neste feriado a artilharia da imprensa é contra a entrada de celulares nas prisões. Ora, as abordagens da imprensa fazem crer que esse seja um problema apenas do governo paulista. Não é, há muito tempo.

Alckmin afirmou que o monitramento de celulares nas prisões ajuda no trabalho de inteligência. É o que temos por ora. Custo a crer que o governo paulista não teria adotado medidas drásticas de revista em presídios caso a lei ou o orçamento permitissem. Também é de ponderar a hipótese de ser esse um dinheiro (instalação de raios x nas prisões) jogado pelo ralo caso fosse medida atodata apenas em presídios paulistas e não no resto do país.

O que realmente estranha é a imprensa tratar o governo paulista como incompetente. Primeiro porque não é. Segundo, a imensa diferença de tratamento em relação aos demais governos e suas ações nem sempre eficientes, abordadas pelo mesmo jornalismo como messiânicas. Terceiro, a quem interessa insuflar um clima de pânico maior do que já é? – e não me refiro ao jornalismo popular.

Resumindo, minha pergunta: Paraisópolis vai virar novela ou não?

Chamando pra lutinha

Quanto mais passam os dias, mas a gente se exercita no botox moral pra olhar tudo com cara de nada, não é mesmo?

Lady Gaga distribuindo comida aos macacos na cidade maravilhosa (não se iluda: em SP será a mesma coisa), Luis Nassif retumbando a (falsa) morte de Niemeyer só porque viu num perfil claramente fake do Estadão no Twitter, e agora essa, o prefeito do Rio Eduardo Paes querer construir um outro autódromo, não para valorizar a cidade do Rio, mas para se medir com São Paulo.

Do Superesportes:

O projeto do novo autódromo internacional do Rio de Janeiro foi apresentado pelo Ministério do Esporte nesta sexta-feira. Com a pista em Deodoro, o prefeito Eduardo Paes sonha desbancar São Paulo e sediar o Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1 no futuro.
“São Paulo que fique esperta, porque eu quero roubar a Fórmula 1 e trazer outras provas também”, disse Paes. A construção do novo circuito é um compromisso dos organizadores dos Jogos de 2016 para desativar o atual autódromo de Jacarepaguá, onde será erguido o Parque Olímpico. (segue)

O tal do novo autódromo será numa antiga área do Exército em Deodoro, hinterland do Rio a que o poder público nunca deu pelota. Antes, terão de fazer uma varredura porque era campo de provas, e o terreno está todo minado (Não. Prefiro não prever nada…)

Vamos ver se dessa vez vai, porque as prefeituras antecedentes (inclusive a de Paes) deixaram o antigo Autódromo de Jacarepaguá virar o que virou: um campo mal-assombrado, sem manutenção nem políticas, subutilizado desde sempre e agora cercado de favelas.

Toda cidade deve fazer suas opções, e tal, e acredito ser bacana ter autódromo até em Fiofó do Norte, mas por que fazer um autódromo pra desbancar outro? O que move o coraçãozinho de Paes ao dizer que “São Paulo que fique esperta, porque eu quero roubar a Fórmula 1”? O que é um “eu” dentro de uma pefeitura e ao longo do tempo?

Ora, ora, sabemos que construir uma obra é a parte mais fácil da bagaça. Duro, duro mesmo é mantê-la, reservar orçamento para ela e fazer manutenção anual, a cada evento de maior magnitude. Fora a trabalheira que é para trazer um evento…

Lembro de ter dado um plá sobre a história do Autódromo de Interlagos, e sobre o esforço da prefeita Erundina em deixá-lo zero bala nos anos 80/90. De lá pra cá, o esforço, notadamente de Gilberto Kassab, para mantê-lo segundo os padrões internacionais. Não contente com isso, Kassab ainda trouxe a Fórmula Indy, debaixo de uma chuva de críticas, e ambas estão aí, mantidinhas e atualizadas ano a ano, trazendo uma bela grana para a cidade.

Eu sei lá o que Fernando Haddad fará com Interlagos. Pode ser até que acate sugestão antiga do PT em transformá-lo num imenso conjunto habitacional, certo? Mas até hoje, o Autódromo de Interlagos tem sido o único no Brasil por obra e graça de administrações responsáveis e de visão.

O que quero dizer é que, à Prefeitura do Rio, não bastam eventos, perfumaria, dinheiro federal e muito menos macaquices pra tentar um pouco de modernidade para a cidade. Depende de vontade, de constância, de lobbies eternos e tals.

De qualquer modo, estou de boa vontade e aguardando o jeitão de Haddad de governar. Morreria de vergonha se ele tivesse atitudes idiotas como as de seu colega carioca.

Monotrilho: de tranqueira a deslumbre

Na melequinha condensada da memória, você se lembra: até as eleições, o Monotrilho que ligará a Estação de Vila Prudente até Cidade Tiradentes e Jabaqurara ao Morumbi, passando pelo Aeroporto de Congonhas – coisa do governo do estado, mas colada em Serra e Kassab – era um monstro “caro” que iria “estragar a paisagem” da cidade, e que não deu certo em alguns países. Depois da vitória de Haddad, ele se transformou da noite para o dia em uma solução moderna e eficiente.

Poderia fazer um levantamento completo por órgão de imprensa, mas vou me ater à revista Época São Paulo, em duas matérias:  a primeira de 17.08.2012 e a segunda de agora, em 02.11.2012.

Antes das eleições, a revista destacou alguns pontos do empreendimento que faziam crer que a decisão será um desastre para a vida da cidade, a começar pelo lead:

“Até que ponto vale a pena alterar a paisagem urbana para ter mobilidade?”

“Primeiro cercaram o canteiro central com tapumes de madeira, o que impediu a visão dos motoristas” – (O transtorno dos idiotas)

“Não dá mais para esconder o resultado do trabalho já realizado: eles instalaram 64 pilastras de 15 metros de altura” – (Hã? Como assim? Era pra esconder?)

“O número não deixa dúvidas: a paisagem da cidade será alterada. E vem daí a maior crítica dos opositores do monotrilho.”

“O espaço embaixo delas poderá ficar abandonado, como em viadutos”, diz Sergio Ejzenberg, mestre em transportes pela USP.

“Para quem vai conviver de perto com a novidade, a preocupação é generalizada. E já há gritaria.” (As madames do Morumbi. Povo da Zona Leste sequer foi entrevistado.)

“Há quem argumente que o melhor para o Morumbi seriam faixas exclusivas de ônibus, que dão conta de demandas menores.” (Novamente as madames. E novamente a ideia cretina dos ônibus. O BRT pode ser lindo em outras cidades. Aqui não dá.)

O resto é um arrazoado de comparações, alarmismo e vitimismo, elencando inclusive os países onde o monotrilho virou um monstro sem utilidade.

Já a matéria pós-eleições vem com um tom lulodilmístico, com destaque para a economia em relação ao Metrô, a modernidade (o mais moderno DO MUNDO”), a tecnologia, a quantidade de toneladas, o silêncio e o ponto central, que parece ser o que amolece os corações: a fábrica em Hortolândia com perspectivas de exportar a tal tecnologia.

Por fim, um ponto que antes era o horror: 50 minutos de viagem no trecho total. Hoje, na era Haddad, essa grande distância (natural. Aqui é SP) se transformou numa vantagem com toque debochado: enquanto viaja, você pode ler vinte páginas do livro da moda.

Convém destacar que toda essa epifania repentina em torno do Monotrilho é tomada como certa porque a obra é do governo estadual. Se fosse da Prefeitura sabe lá se não seria adiada? Haddad já mostrou petisticamente a que veio: alegar problemas orçamentários pra não fazer droga nenhuma.

  • Foto: Monotrilho de Sidney: na matéria pré-eleições, uma traquitana sem utilidade. Já podem usar a foto de novo, desta vez como solução inovadora. As propagandas (de tudo) já estão usando imagens assim para ilustrar o futuro do tipo Jetsons…